sábado, 11 de novembro de 2017

Salmos 102: Oração de um homem aflito

1 Ouve a minha oração, Senhor! Chegue a ti o meu grito de socorro!
2 Não escondas de mim o teu rosto quando estou atribulado. Inclina para mim os teus ouvidos; quando eu clamar, responde-me depressa!
3 Esvaem-se os meus dias como fumaça; meus ossos queimam como brasas vivas.
4 Como a relva ressequida está o meu coração; esqueço até de comer!
5 De tanto gemer estou reduzido a pele e osso. 6 Sou como a coruja do deserto, como uma coruja entre as ruínas.
7 Não consigo dormir; pareço um pássaro solitário no telhado.
8 Os meus inimigos zombam de mim o tempo todo; os que me insultam usam o meu nome para lançar maldições.
9 Cinzas são a minha comida, e com lágrimas misturo o que bebo,
10 por causa da tua indignação e da tua ira, pois me rejeitaste e me expulsaste para longe de ti.
11 Meus dias são como sombras crescentes; sou como a relva que vai murchando.
12 Tu, porém, Senhor, no trono reinarás para sempre; o teu nome será lembrado de geração em geração.
13 Tu te levantarás e terás misericórdia de Sião, pois é hora de lhe mostrares compaixão; o tempo certo é chegado.
14 Pois as suas pedras são amadas pelos teus servos, as suas ruínas os enchem de compaixão.
15 Então as nações temerão o nome do Senhor e todos os reis da terra a sua glória.
16 Porque o Senhor reconstruirá Sião e se manifestará na glória que ele tem.
17 Responderá à oração dos desamparados; as suas súplicas não desprezará.
18 Escreva-se isto para as futuras gerações, e um povo que ainda será criado louvará o Senhor, proclamando:
19 "Do seu santuário nas alturas o Senhor olhou; dos céus observou a terra,
20 para ouvir os gemidos dos prisioneiros e libertar os condenados à morte".
21 Assim o nome do Senhor será anunciado em Sião e o seu louvor em Jerusalém,
22 quando os povos e os reinos se reunirem para adorar o Senhor.
23 No meio da minha vida ele me abateu com sua força; abreviou os meus dias.
24 Então pedi: "Ó meu Deus, não me leves no meio dos meus dias. Os teus dias duram por todas as gerações!"
25 No princípio firmaste os fundamentos da terra, e os céus são obras das tuas mãos.
26 Eles perecerão, mas tu permanecerás; envelhecerão como vestimentas. Como roupas tu os trocarás
e serão jogados fora.
27 Mas tu permaneces o mesmo, e os teus dias jamais terão fim.
28 Os filhos dos teus servos terão uma habitação; os seus descendentes serão estabelecidos na tua presença.
COMENTÁRIOS:
102 Oração de um homem aflito. Servos de Deus também passam por grandes aflições, e por vezes têm queixas para apresentar a seu Senhor. É totalmente legítimo — e bastante curador — poder apresentar ao nosso Pai do Céu não somente os louvores, mas também nossas “reclamações”. Este salmo pode ser muito útil em situações em que lidamos com a possibilidade clara de morte. Veja o quadro “Exercícios de oração nos Salmos” (Sl 23).
102.1-3 a minha vida está desaparecendo. O salmista lamenta a sua situação, debilitado e à beira da morte, ainda bem antes de sua velhice (v. 23). Esta é uma situação que pode ocorrer a qualquer um de nós, seja por contrairmos uma doença grave, por sofrermos um acidente, sermos vítima de violência, ou por enfrentarmos grande opressão e ansiedade psicológica. O que podemos fazer a respeito? Acima de tudo, tal como fez o salmista, conversar com Deus. É bom e positivo buscar ajuda com nossos amigos e também ajuda profissional de médicos e psicólogos, mas há angústias às quais nenhum ser humano poderá atender satisfatoriamente. O salmista ora e pede a Deus: escuta o meu grito pedindo socorro… responde depressa. Veja também as próximas notas.
102.3-7 o meu corpo queima. Nessa comunicação com Deus, não se acanhe e descreva suas dores e seus sentimentos. Praticamente o salmo inteiro é uma descrição da condição do salmista, em diálogo com Deus.
102.8 meus inimigos me insultam. Além dos sofrimentos físicos, há também a rejeição e ataques pessoais por parte de inimigos. Veja também o quadro “Quem são os nossos inimigos” (Sl 17).
102.9-10 por causa da tua ira e do teu furor. Mesmo sendo atacado por inimigos, o salmista sabe que Deus é o soberano e que, se ele está sofrendo, em última análise foi porque Deus permitiu — ou mesmo quis — que isso acontecesse. Essa é uma realidade dura para nós, mas é um ponto importantíssimo para encontrarmos consolo em nossas aflições: de alguma forma, nossos sofrimentos passam pela mão de Deus, portanto é com ele que temos de nos entender. Veja também 2Co 12.7-10, notas.
102.12-28 Mas tu, ó SENHOR Deus. Depois de derramar sua triste condição na presença de Deus, o salmista encontra espaço para se lembrar de quem é Deus. Ele encontra consolo em que Deus é sempre o mesmo, é Rei inabalável. Dele dependemos nós e toda a criação.
102.13 terás pena de Jerusalém. Além da condição individual do salmista, o sofrimento foi aumentado porque a cidade que sempre representou a presença e a bênção de Deus está em ruínas (Jerusalém foi destruída em 586 a.C., pelo imperador babilônico Nabucodonosor). Já é hora de teres compaixão dela. Todos nós gostaríamos que as intervenções de Deus obedecessem ao nosso cronograma e atendessem aos nossos interesses imediatos. Felizmente, podemos apresentar a Deus esses desejos e reivindicações: ele é maior que a inconstância dos nossos desejos e sabe suprir o melhor, na hora mais adequada, sempre — ele sabe que nós nem sabemos orar como convém (veja Rm 8.26-30, nota).
102.14-22 Ainda que ela esteja destruída. Ao continuar em sua conversa com Deus, o salmista já não precisa mais falar de si. Tendo já contado sua desgraça, ele pode agora contemplar a grandeza de Deus (v. 12). Ele contempla também a miséria da realidade externa, e proclama em sua oração que a bondade de Deus vencerá a miséria humana, não só na sua Jerusalém, mas em todo o mundo. Deus já havia feito isso no Êxodo (v. 20), e novamente salvará a seu povo, trazendo o mundo inteiro à adoração (v. 22).
102.23-24 Deus… encurtou a minha vida. Por fim, depois de receber ânimo e consolo ao celebrar a grandeza de Deus, o salmista pode voltar a tratar da realidade de seu sofrimento. Tendo vivido muito antes da morte de Jesus Cristo, ele não conhecia a realidade da ressurreição e da vida eterna tão claramente como o Novo Testamento ensina. Mas, em seu relacionamento transparente e próximo com Deus (ele agora o trata por “meu Deus”), o salmista sabe que pode expressar seu pedido. E até o faz com uma pitada de ironia: tu que vives para sempre, não me leves agora, antes que eu envelheça. Diferentemente do início, porém, esse pedido agora aparece em paralelo com a afirmação da grandeza de Deus. A terra e o céu vão acabar. O salmista constata que a natureza também sofre desgaste — como ele — e carece de revitalização. Agora ele está fortalecido na certeza de que é Deus na sua soberania e eternidade que controlará todas as coisas: Tu és sempre o mesmo.
102.25 Os nossos filhos… e os seus descendentes terão sempre a tua proteção. Aqui fica claro o consolo recebido. O salmista fica em paz com a realidade de que pode vir a morrer logo, e encontra o consolo, convencido da verdade de que seus filhos viverão, e Deus cuidará de toda a sua descendência. Vemos como a aceitação da limitação humana junto com a constatação do cuidado de Deus com os que ficam retira o salmista do desespero, e lhe permite de certo modo “transferir” seu desejo de viver para seus descendentes. O descanso é assegurado pela proteção divina; agora ele está ciente de que a tem e, portanto, seus filhos e netos também sempre a terão. O próximo salmo (103) parece ser uma consequência deste consolo, e se dedica inteiramente a contemplar e louvar a bondade e a misericórdia de Deus.



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