terça-feira, 15 de março de 2016

BlogIEP entrevista: pastor Mario Barroso ( Como é ser cristão em Cuba?)

ANAJURE – Como é ser cristão em Cuba, e como é o trabalho que o senhor desenvolve na Igreja Batista?
Mario Barroso – Ser cristão em si já é um grande privilégio. E neste país, onde vivemos num regime totalitário por mais de 50 anos é um privilégio ainda maior, pois apesar das dificuldades os princípios do Reino de Deus se destacam neste tipo de governo opressor. Devido à necessidade de obreiros, ensino Novo Testamento no Seminário Teológico da Primeira Igreja Batista, na cidade de Santa Clara, e em três filiais do Seminário Teológico Batista de Havana, nas três congregações situadas em Vueltas, Remedios e Cruces. O meu trabalho como pastor de duas congregações no centro de Cuba, nas comunidades de Taguayabón e Rosalía, onde há muita limitação e carência econômica, é bastante difícil. Sou um pastor sem carro, sem telefone fixo, sem internet, sem biblioteca onde eu possa conseguir literatura atualizada, e o teto de um dos templos que tem quase dois séculos está quase caindo. Mas sabemos que vale a pena tentar imitar a Cristo, que também viveu essas tensões e privações num contexto muito parecido, mas sem vacilar. Além do Evangelho eterno que salva das conseqüências do pecado, nós espalhamos os valores e a ética do Reino de Deus, tão carentes em Cuba. Princípios que não fazem parte, por exemplo, da única educação legalizada da ilha, que é controlada pelo regime. E por assim ser, a educação é desenhada para doutrinar nossas crianças através de um programa educacional totalmente ideologizado e formatado pra semear ateísmo e violência nas mentes.
A – Qual o maior desafio da igreja cubana na atualidade?
MB – A igreja cubana enfrenta grandes desafios desde o passado. Nos anos 60, por exemplo, o regime político vigente declarou guerra ao cristianismo, se filiou às doutrinas leninistas, e literalmente declarou que a religião era a coisa mais danosa que podia existir debaixo do céu. O governo colocou ainda muitos cristãos em campos de concentração, denominados de Unidades Militares de Apoyo a la Producción (UMAP). Em 1965, nós batistas vivemos uma das maiores crises da nossa história porque a maioria dos nossos pastores foram presos. Uma das igrejas que pastoreio, a de Taguayabón, durante mais de ano teve um selo em sua porta, após ter todos os seus móveis confiscados. Um juiz chegou ao ponto de declarar ao pastor Luis Manuel González Peña, que na época era líder dos batistas cubanos, que em 30 anos não haveria mais nenhuma igreja em Cuba. O pastor respondeu: – “Senhor magistrado, o Cristianismo existe a quase dois mil anos e nada, e nem ninguém, conseguiu destruí-lo. Em 30 anos teremos o dobro de igrejas em Cuba!”. E assim foi.
Desde a crise na qual caiu o regime nos anos 90, sem o amparo da antiga União Soviética que ajudou Cuba a cometer tantos desatinos, as igrejas se multiplicaram num autêntico avivamento. Hoje, o debilitado regime político de Cuba está obrigado a buscar pilares sobre os quais possa se apoiar para tentar sobreviver. A mesma igreja que se pretendeu destruir antes, agora se pretende usá-la. O desafio maior para a igreja cubana na atualidade está no fato dela conseguir não escutar as falsas adulações, nem cair nos enganos e chantagens do governo. Para uma sociedade moralmente desolada, depois de cinco décadas de destruição generalizada, na qual o dano antropológico é grande, uma igreja disposta a condenar os responsáveis e a sarar as vítimas, representa nosso maior desafio. No meio de comportamentos tão vis, onde o mal age ferozmente, servir a Cristo passa a ser uma grande responsabilidade. Mas quem deseja viver às custas de Cristo encontrará um bom lugar, pois o Regime pede a gritos "sacerdotes e profetas" que segundo o modelo oferecido em Apocalipse 13, entreguem sua boa visão ao poder político e adormeçam a massa.
A – Como tem sido o trabalho do senhor com relação à Liberdade de religião e de expressão em Cuba?
MB – O evangelho de Cristo, nas palavras de Dietrich Bonhoeffer, "libera-nos de tudo o que nos oprime…". Uma pregação equilibrada das boas novas de Cristo não está separada da defesa das liberdades que todos os seres humanos têm direito. Embora o regime tenha feitos esforços para me isolar nas comunidades rurais no centro de Cuba, pelas quais tenho muito amor, os púlpitos nos quais proclamo o evangelho e a ética do sermão da montanha estão ganhando mais espaço com o auxílio das novas tecnologias, mesmo com o fato de não possuirmos internet em casa e nos sacrificarmos bastante para tal. Em novembro de 2010 nasceu o meu blog, cubanoconfesante.com, que completa agora três anos. E em janeiro de 2012 a minha conta no twitter @maritovoz, que logo se uniu ao de minha esposa @yoaxism, aumentou ainda mais o nosso alcance. Esses meios estão sendo usados por Deus para salvar nossas próprias vidas, e também como um meio de Graça, para cumprir a dupla missão que está entranhada em nós que é DENUNCIAR E ANUNCIAR. Sem a ajuda de Deus isto seria humanamente impossível. O Regime cubano tem resistido em sua maldade com o passar dos anos. Diferente de sua melhor aliada, a Coreia do Norte – a quem não interessa cuidar de sua própria imagem – os que governam Cuba se preocupam com isto, fato que os fazem mais perigosos, porque já não fuzilam abertamente, como ocorre na Coreia. Em Cuba, se gloriam de uma moratória da Pena de Morte desde 2003, no entanto assassinam extrajudicialmente, e as mortes de Juan Wilfredo Soto (maio de 2011), Laura Pollan (outubro de 2011) e Oswaldo Paya (julho de 2012) são a prova disto.
A – Por favor, deixe uma reflexão para a Igreja Brasileira acerca das oportunidades e orar e ajudar a igreja perseguida em Cuba.
MB – Em 3 de novembro, diversas organizações cristãs a nível mundial, incluindo a CSW e a Open Doors, convocaram um dia mundial de oração pela igreja perseguida. Mas não basta apenas um dia de oração para interceder por nossos irmãos em tribulação pelo mundo. Hebreus 13.3 deve converter-se em um imperativo enquanto houver sofrimento no mundo. Em nome da igreja de Cuba, que se encontra diante do enorme desafio de não ser cúmplice de um regime que a cada dia é desmascarado pela história, pedimos muita oração pelos nossos irmãos, na Igreja brasileira. Gestos como o de Raimundo Barreto, da Aliança Batista Nacional, são exemplos do que o Brasil pode fazer, não sendo indiferente ante o clamor de liberdade de um povo que sofre e cujos direitos são pisoteados por uma família que se apropriou do país há mais de 50 anos e ainda o usa como um feudo. Não posso perder esta oportunidade para colocar como exemplo no Brasil o Ministério Luz para o Caminho, da Igreja Presbiteriana do Brasil, dirigido pelo pastor Hernandes Dias Lopes, com sede em Campinas- SP. Eles têm investido com orações e finanças para que literatura cristã impressa e multimídia chegue a Cuba, com uma mensagem edificante que nos inspira em nossa missão. O devocional 'Cada Dia' que eles enviam para ser distribuído gratuitamente dentro da ilha transformou-se no devocional diário de milhares de cubanos. Em nossas igrejas temos sido beneficiados por sua solidariedade. Outras igrejas e ministérios no Brasil também podem fazer o mesmo, além de orar, claro. Uma mensagem muito importante para o Brasil: o debilitado regime que desgoverna a ilha por mais de 50 anos não tenta encontrar só na igreja um punhal para ferir sua cambaleante estrutura, mas também o faz no Brasil – O gigante do sul. É importante que o Brasil receba sabedoria de Deus e não se deixe enganar, mas entenda que uma coisa é o regime que se apoderou da ilha, e outra coisa é o povo cubano. A prosperidade econômica do Brasil constitui um ponto de observação para o regime no continente. Tratando de buscar ajuda para manter-se no poder. Que o Brasil, e em especial a igreja brasileira, passe pela história como um povo que ajudou os cubanos a se libertarem do jugo do atual regime, e não o contrário. A propaganda do regime de Havana é habilidosa e confunde a muitos, tal como, demonstra o caso da Open Doors, embora estejamos seguros que eles irão reavaliar a lista com base em nossos argumentos. Não se enganem. Agradecemos ao Brasil pelos investimentos milionários realizados no porto de Mariel, em Havana, que isto será algo muito importante para a futura Cuba democrática que sonhamos, onde os direitos humanos são respeitados. Ressaltamos que é importante que o dinheiro deste porto não fique com uma elite que a cada dia enriquece mais, enquanto oprime um povo cada vez mais empobrecido. Esses recursos não devem servir para que o povo seja ainda mais maltratado. Se a igreja brasileira puder incentivar seu governo para que ele priorize os direitos humanos em sua política exterior acima dos interesses econômicos, não ficará dúvida de que o fizeram por se alinhar aos interesses de Cristo em nossa sofrida ilha…
Por fim, nossa oração é que Deus continue abençoando o Brasil!
Fonte: ANAJURE Wanda Galvão – Jornalista e Secretária Administrativa

2 comentários:

  1. Estou a tentar visitar todos os seguidores do Peregrino E Servo, e verifiquei que eu estava a seguir sem foto, por motivo de uma acção do google, tive de voltar a seguir, com outra foto. Aproveito para deixar um fraterno abraço.
    António Jesus Batalha.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. A Paz do Senhor meu querido ficamos felizes com o seu comentário e sua presença nos alegra muito aqui no BlogIEP. Deus lhe abençoe e toda a família

      Excluir